1) Como você conheceu o trabalho do Henfil?
Conhecia Henfil pelo Pasquim, admirava seu trabalho e encontrei com ele num dos salões de Piracicaba, em 1976, talvez.
2) Qual foi o impacto inicial?
Uma pessoa agressiva e crítica, duas qualidades naquela época.
3) O que chamou mais atenção: o humor escrito, as gags visuais ou o traço?
Os cartuns e personagens de quadrinhos, além do traço, é claro.
4) Seu trabalho teve influência direta?
Sim, e muita. Queria ser crítico como ele, fazer desenhos simplificados e diretos como os dele. Estive hospedado em sua casa em São Paulo por uns dias e recebi muitas dicas dele sobre como fazer um quadrinho politicamente engajado. Trocamos algumas cartas sobre isto. Veja aqui um relato sobre estes momentos https://lorcartunista.blogspot.com/2018/01/henfil-o-palestino.html
5) Qual foi a impacto dos Quadrinhos e Charges do Henfil na Imprensa Sindical? E na esquerda?
Henfil influenciou a todas os cartunistas da minha geração que tinham uma perspectiva de esquerda. Tentamos fazer em nossos nichos o que ele fazia no Pasquim e na grande imprensa.
6) Acompanhava as entrevistas do Henfil na Imprensa? Teve alguma que lhe marcou?
Sim, tudo o que ele falava era importante para nós. Sua tentativa frustrada de trabalhar nos Estados Unidos foi a maior lição sobre colonialismo cultural que poderíamos ter ao vivo.
7) O que achou da iniciativa da Editora Noir em reunir estas entrevistas em um livro? Que efeito acha que este livro terá em você e nos demais leitores?
Boa ideia: será um prazer rever e repensar aquele tempo.
8) Henfil era um profissional multimídia, atuando na TV e no Cinema. O que achou das produções do cartunista em TV Homem e Tanga, deu no New York Times?
Achava sua tentativa de se adaptar a outras mídias atrevida e necessária, mas os resultados não foram bons. Deu no New York Times é um desastre como filme. A TV Homem tem momentos muito bons.
9) Pra você, qual é o tamanho da falta que Henfil faz?
Peço novamente que veja o texto que escrevi no Blog sobre sua morte. Minha dor está colocada lá e não estou com forças para reviver tudo aquilo neste momento.
10) As novas gerações conhecem pouco do trabalho do Henfil. Apesar de exposições e do enorme esforço do Instituto Henfil, criado pelo filho Ivan Cosenza, o material de Henfil ainda é pouco compartilhado nas redes. O que fazer pra melhorar isso?
Acho que toda arte, incluindo os cartuns, são manifestações históricas. Somos datados. Cada época tem a sua linguagem, suas questões e soluções. Acho ilusório tentarmos recuperar o impacto do Henfil ou de qualquer um de nós numa época diferente daquela em que ele atuou com grande repercussão popular.
11) O Brasil hoje está ‘sick da vida’ com tantos ataques à democracia, à inclusão social, racial e de gênero, à distribuição de renda… Como Henfil estaria reagindo à sanha fascista, totalitária e anti-democrática que abocanhou os três poderes?
Acho que estaria reagindo com as armas que dispunha (e dispomos): escrevendo, desenhando e se posicionando contra o bolsonarismo. Apesar de sua argúcia política, tenho a impressão de que ele se surpreenderia com a parcela da população que se revelou de extrema direita no Brasil.
12) Como Henfil estaria reagindo à sanha fascista, totalitária e anti-democrática que abocanhou os três poderes?
Provavelmente com a fúria dos justos que ele exibia diante da ditadura e da miséria social.
13) Henfil foi um dos fundadores do PT, que se propunha a transformar radicalmente a sociedade. Esta décima terceira pergunta é o espaço pra suas considerações, não finais, mas futuristas. É possível ainda transformar o país de forma radical? O humor entra nisso?
Sim, Henfil foi um dos fundadores do PT e hoje talvez estivesse num partido mais combativo (como o PSOL, talvez) por causa dos acordos que o PT fez com o centrão e outros desvios bem conhecidos do sonho inicial. Quanto a transformar o país, acredito que uma nova sociedade pode evoluir do capitalismo, mas somente se isso for acontecendo aos poucos e transformando o mundo como um todo. Os desafios são aparentemente insuperáveis. Há momentos em que fico cético de que conseguiremos superar a crise climática e a desigualdade econômica, sem falar no poderio militar nuclear que ainda existe sobre nossas cabeças. Construímos uma sociedade cujo funcionamento depende do crescimento exploratório das pessoas e do planeta. Não sei se existe uma maneira de mudar esta estrutura que se tornou automática. Além de tudo, somos guiados pelo acaso com nenhum ou pouquíssimo livre arbítrio. Não creio que estejamos bem equipados para mudar o mundo antes que sejamos extintos como civilização. Mas não me resta nenhuma opção além de acreditar que devemos tentar.
Contatos:
rodrigues.loc@gmail.com https://www.facebook.com/luiz.rodrigues.77736https://lorcartunista.blogspot.com
LOR é cartunista desde 1973, publicou 5 mil charges, ilustrações e cartuns em diversos órgãos de imprensa. Foi premiado em salões internacionais de humor e recebeu o “Troféu Angelo Agostini” de Mestre do Quadrinho Nacional em 2006 (SP). Publicou livros com cartuns e quadrinhos, ilustrou livros de ciências e literatura; cartilhas sobre saúde, direitos humanos, preservação ambiental e construção da cidadania. LOR também é médico formado pela Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais em 1972, foi Professor Titular na UFMG. Foi Pesquisador do CNPq, publicou artigos e realizou orientações de iniciação científica, mestrado e doutorado.