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Expo Vacina Salva

A AQC-ESP – Associação dos Quadrinhistas e caricaturistas do Estado de São Paulo e Revista Pirralha convocam todos os artistas a participarem da

EXPOSIÇÃO VIRTUAL “VACINA SALVA”

Envie charge, cartum, tira ou página em Quadrinhos. Queremos, através do humor, fazer as pessoas refletirem sobre a importância da Ciência em nossa sobrevivência e até… fazer rir.

É mais uma atividade em homenagem ao Dia do Quadrinho Nacional. Pode ter conteúdo político, social, cotidiano ou o que achar melhor. Só não aceitaremos artes que reforcem preconceito ou negacionismo.

As artes precisam ser de página única em 300dpi.

Enviar até o dia 06/02/2022 para os emails:

trofeuangeloagostini@gmail.com e biradantas2000@yahoo.com.br

Os trabalhos serão expostos no Blog, site e redes sociais da AQC e da Revista Pirralha.

Nos links: http://aqcsp.blogspot.com , no site https://revistapirralha.com.br/ e nas páginas: https://www.facebook.com/aqcsp https://www.facebook.com/RevistaPirralha e https://www.instagram.com/revistapirralha/. Venha participar conosco!!

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AQC entrevista: Daniel Saks sobre Henfil

Esta série de entrevistas foi uma iniciativa da AQC em apoio ao livro “Sick da Vida”, coletânea de entrevistas do cartunista Henfil organizadas pelo quadrinhista, jornalista, escritor e biógrafo Gonçalo Silva Junior. O livro foi lançado com sucesso na plataforma Catarse pela Editora Noir, recebeu 235 apoios e ultrapassou a meta para publicação em quase 50%, atingindo 147% e comprovando que as ideias do cartunista Henfil propagadas em suas entrevistas continuam sendo atuais e esclarecedoras. A AQC se sente orgulhosa em ter apoiado uma iniciativa tão incrível e necessária.https://www.catarse.me/henfil

1. Como você conheceu o trabalho do Henfil? Lembra da ocasião (onde, quem apresentou e qual era a revista ou jornal)?

Lembro claramente da primeira vez que ouvi falar do Henfil. Infelizmente foi no Jornal Hoje na televisão quando noticiaram sua morte. Quatro coisas me chamaram a atenção particularmente: 1. Eu estava com quase treze anos de idade, já lia quadrinhos há pelo menos seis, e colecionava havia exatos dois. Na época, embora já leitor da Chiclete com Banana, onde certamente ele devia ter sido citado, me surpreendi por noticiarem um cartunista que eu não conhecia pelo nome, e que era importante para ser noticiado na Globo. 2. Achei um barato o jogo de sílabas iniciais para formar o nome artístico. Pensei comigo mesmo: “Como eu nunca pensei numa ideia dessas!?”. 3. No noticiário (que depois passou a noite também no Jornal Nacional) mostravam em close o Henfil fazendo caretas sorridentes, percebi que ali estava um artista provocador, sarcástico. 4. Notei que a notícia teve algum impacto nos meus padrinhos (estava na casa deles na hora que passou a notícia). A primeira vez que li material do Henfil foi na escola com alguns colegas no final do mesmo semestre, eram umas tiras em que o Fradim saia falando que amava o Figueiredo, e na época eu achava engraçado, mesmo sem entender a ironia que ele queria expor (não sei se ainda hoje teria a sagacidade de compreender integralmente). Alguns meses depois li na revista Geraldão que o Glauco o homenageou, me pareceu mais provocador (já não era mais tempo de ser chamado de subversivo) do que eu já sabia que era.

2. Qual foi o impacto?

Como respondi antes, já tinha certeza de que não entendi o que li incialmente. Aos poucos fui lendo aleatoriamente o material dele em oportunidades. Até que em 1997 achei uma revista Fradim 14 da editora Codecri numa liquidação de encalhes de uma distribuidora no interior do Paraná a preço de bala. Ali tive um pouco mais de contato com a vida e acidez do autor, foi quando comecei a entender a abrangência e relevância da obra do Henfil, e consegui mais alguns números do Fradim em sebos. Poucos anos depois, como consequência de outra liquidação na mesma cidade (nesse caso foi de uma pessoa) ganhei de presente uma coletânea da Graúna. O trabalho do Henfil então me acertou em cheio, era de uma exploração irônica ímpar da miséria brasileira. Tinha horas que eu me sentia até mal de rir de suas piadas, aquilo era para chocar e causar reflexões, e o Henfil sabia que precisava nos fazer rir para aceitarmos o tapa na cara que a realidade nos dava. Demorou anos para ter a mesma percepção com outros autores.

3. O que chamou mais atenção: o humor escrito, as gags visuais ou o traço?

Várias coisas. Às vezes no desenho era um frade fazendo gesto obsceno, ora os personagens sem cenário e ainda assim sinalizava uma sequência. Mesmo diferente do traço que estava mais acostumado, achava muito bacana aquelas imagens em que apareciam miseráveis desfigurados. O humor ácido foi sem dúvida o ponto alto para mim. Gostaria de ver o Henfil hoje desobstruindo as barreiras do politicamente correto, certamente seria atacado por todos os lados, algo semelhante ao atentado do Charlie Hebdo poderia ocorrer a ele.

4. Seu trabalho teve influência direta? Se teve, em que sentido?

É muito bom poder apreciar a ironia e a acidez da linguagem do Henfil, era quase um diálogo, ou uma fuga àquelas conversas que não se podia ter com qualquer um. Infelizmente não é o tipo de linguagem que se poder ter com a maioria hoje. A ironia é uma figura de linguagem em que a pessoa que não a entende se sente ofendida ao invés de convidada a discutir o assunto ou apenas curtir a diversão em pauta.

5. Qual foi a impacto dos Quadrinhos e Charges do Henfil na Imprensa Sindical? E na esquerda?

Não posso responder sobre isso, pouquíssimas vezes tive contato com periódicos sindicais, e muito depois da morte do Henfil. Esses periódicos, assim como os sindicatos, que tive contato estavam abaixo do nível intelectual e produtivo do autor. Sobre a esquerda, só posso especular, creio que as charges do Henfil reverberavam as mudanças que a sociedade ambicionava na época. Provavelmente a esquerda se manifestava como a forma de viabilizar essas mudanças. Entre meus amigos na época, só ríamos das piadas dele até onde conseguíamos entender, sem qualquer viés de orientação política, apenas diversão, não haveria o que apreciar politicamente nem era necessário, apenas aquelas piadas que pareciam mais inteligentes que as dos gibis Disney e Turma da Mônica. Ele produzia um humor que poderia fazer sentido a todas as idades, como o Quino fazia, porém, o Henfil era mais sacana.

6. Acompanhava as entrevistas do Henfil na Imprensa? Teve alguma que lhe marcou? Porquê?

Nenhuma, primeira vez que o vi foi na notícia de sua morte. Nos gibis do Fradim gostava muito das crônicas que ele reproduziu do tempo que passou nos EUA, creio que o título era Crônicas de um Subdesenvolvido. Muitas li depois que visitei o país duas vezes (em 2008 e 2012), aquilo reproduzia quase integralmente os sentimentos e percepções que tive por lá, e quando voltei.

7. O que achou da iniciativa da Editora Noir em reunir estas entrevistas em um livro? Que efeito acha que este livro terá em você e nos demais leitores?

Será interessante ler tal livro, desde que tanto o editor quanto os leitores saibam se situar no tempo, entender que retratam uma época que passou, e não devemos retroceder a ela. Espero que a edição do livro e a leitura dele passem longe de paixões e engajamentos. Sejam mais focados na vida e obra do Henfil.

8. Henfil era um profissional multimídia, atuando na TV e no Cinema. O que achou das produções do cartunista em TV Home e Tanga, deu no New York Times?

Não acompanhei na época. Tenho certeza que perdi muito, tenho o mesmo sentimento em relação ao jornalista Paulo Francis.

9. Pra você, qual é o tamanho da falta que Henfil faz?

Ele teve sucessores que, se tiveram seu trabalho como referência, não eram ele próprio. Certamente faz falta, seria muito divertido tê-lo presente na imprensa atualmente. A morte dele foi consequência da contaminação pelo HIV em função da hemofilia, é lamentável pensar que com um pouco mais de controle nos estoques de sangue da época, ou mesmo os tratamentos para soropositivos que vieram depois, permitiriam que ele pudesse estar vivo, produzindo e bem de saúde hoje em dia. Faltou muito pouco tempo para isso, infelizmente. O legado é que casos famosos como o dele, aceleraram as pesquisas pela maior eficiência desses meios de detecção e tratamento.

10. As novas gerações conhecem pouco do trabalho do Henfil. Apesar de uma exposição de originais no Centro Cultural Banco do Brasil (2005) no Rio e em SP ter tido público recorde na época. O que fazer pra melhorar isso? O livro organizado pelo Gonçalo Jr pode ajudar?

É certo que ajuda, mas é difícil quantificar, pois a abrangência de livros como os do Gonçalo fica muito restrita aos leitores de quadrinhos, e parte desse público já é entusiasta do Henfil. Certamente irá ajudar a ampliar o conhecimento sobre o artista, e será mais um tijolo na bibliografia dessa figura importante. O Gonçalo tem a gana de jornalista, ele usa muitas páginas para situar os leitores nos cenários da época (até repete isso ao longo do texto) e em suas obras sempre gosta de trazer algo que ninguém mais sabe, como um furo de reportagem, vamos ver qual será a novidade neste livro. Sobre o que mais pode ser feito para melhorar é analisar e publicar de forma a perpetuar o trabalho do artista, se houver algum interesse além da arte, vai até criar rejeição ao artista. Já quanto à publicação, acho que não deve se limitar ao vício dos livros luxuosos. Como já foi questão desta entrevista, Henfil foi da imprensa, comunicação de massa, isso foi um dos fatores para ele alcançar o status a que chegou. A revista do Fradim teve numeração maior que a maioria das revistas em quadrinhos nacionais, ela atingia público adulto a preço barato, foi a fórmula do sucesso, um sucesso que o mercado de quadrinhos abriu mão. Deixar claro que o Henfil merece coletâneas luxuosas do seu trabalho, mas essa modalidade não servirá para atingir público.

11. O Brasil hoje está ‘sick da vida’ com tantos ataques à democracia, à inclusão social, racial e de gênero, à distribuição de renda? Ou a coisa precisa piorar mais pro povo reagir?

O Brasil de hoje é muito melhor que o da época do Henfil, certamente ele estaria mais contente com o país de hoje. A democracia evoluiu e está mais forte, as pessoas estão votando (quando ele morreu havia uma ou duas eleições com analfabetos com direito de voto), o poder está alternando; a fome diminuiu; inclusão e distribuição de renda aumentaram, mesmo que ainda numa base não sustentável. A educação e informação estão mais disponíveis às pessoas, mesmo que a qualidade dessas duas parcelas seja insuficiente. De pior, a crítica e os questionamentos se reduziram às preferências pessoais, e não aos fatos. Há diferenças a serem resolvidas, mas não é interesse de quem possa resolver isso abrir mão de privilégios. É melhor não torcer para a coisa piorar, melhor é olhar para o futuro do que retroceder para achar que conseguiremos corrigir o passado.

12. Como Henfil estaria reagindo à sanha fascista, totalitária e anti-democrática que abocanhou os três poderes?

Acreditar que exista essa sanha, e que tenha tomado os poderes da República é um ato de diminuir a importância do país a poucas personalidades, não é assim que se deve discutir os assuntos, pois não é a realidade. Hoje há fenômenos de mídia que exaltam fatos pequenos, e dentro dela os agentes públicos encontraram uma forma midiática de arregimentar seu público, são as regras naturais e consequenciais do jogo que se construiu. Se é possível mudar isso, vai levar tempo. De volta ao Henfil, nunca se saberá como aconteceria, ele já morreu e não se pode saber o quanto ele se orgulharia ou se decepcionaria com a situação. Se for seguida a linha do humor de alto nível que ele produzia, certamente avacalharia todos os presidentes, autoridades e demais figuras públicas relevantes, como outros também fizeram. A diferença é que na época havia mais respeito às personalidades e ao público, e o importante seria o humor. Hoje a criticidade e capacidade dos autores os levam apenas a atacar agressivamente somente as personalidades que eles não gostam, quem perdeu com isso foi o humor.

13. Henfil foi um dos fundadores do PT, que se propunha a transformar radicalmente a sociedade. Esta décima terceira pergunta é o espaço pra suas considerações, não finais, mas futuristas. É possível ainda transformar o país de forma radical? O humor entra nisso?

Eu desconhecia que ele fosse um dos fundadores do PT, ele talvez se decepcionaria com uns e se orgulharia de outros caminhos tomados pelo partido. Haveria espaço para ele destilar seu humor incrível. Em todos os exemplos da humanidade não foi observado benefício em radicalismo, a sociedade sempre evitou isso e, quando se viu obrigada a fazê-lo em forma de protesto, não foram boas as consequências. A moderação e diálogo com respeito é a forma de abrandar e fortalecer as mudanças. Os dois maiores países do nosso continente experimentam retrocessos há décadas ao ceder ao radicalismo. A África do Sul precisava de uma ação radical, e uma das maiores vítimas do Regime ao qual o país estava submetido assumiu o poder sem rancores e com a agenda de seguir em frente, não de resolver o passado. Sobre onde o humor entra nisso, espero que como registrador apenas, pois governos são assuntos muito sérios.

QUEM É DANIEL SAKS

Daniel Saks, engenheiro químico, é colecionador de gibis desde 1985. Apaixonado por sua coleção e pelo quadrinho nacional, se dedicou à pesquisa do mercado de revistas. Por uma coincidência e felicidade de eventos se tornou editor independente em 2015 quando relançou os clássicos títulos da editora D-Arte, Calafrio e Mestres do Terror.

Contatos:

E-mail do Correio Calafrio revistacalafrio@gmail.com https://www.facebook.com/Calafrio-e-Mestres-do-terror-1492199694410890

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https://www.instagram.com/explore/tags/revistacalafrio/

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AQC entrevista: Beth Lorenzotti sobre Henfil

Esta série de entrevistas foi uma iniciativa da AQC em apoio ao livro “Sick da Vida”, coletânea de entrevistas do cartunista Henfil organizadas pelo quadrinhista, jornalista, escritor e biógrafo Gonçalo Silva Junior. O livro foi lançado na plataforma Catarse pela Editora Noir, recebeu 235 apoios e ultrapassou a meta para publicação em quase 50%, atingindo 147% e comprovando que as ideias do cartunista Henfil propagadas em suas entrevistas continuam sendo atuais e esclarecedoras. A AQC se sente orgulhosa de ter apoiado uma iniciativa tão incrível e necessária.https://www.catarse.me/henfil Você pode ter mais informações sobre como adquirir o livro através do site https://editoranoir.com/ ou da página do Facebook: https://www.facebook.com/editoranoir/

1-Como você conheceu o trabalho do Henfil?

Foi no Pasquim, durante a ditadura. O jornal alternativo que todos líamos e nos lavava a alma, e ainda era super engraçado.

2- Qual foi o impacto inicial?

Eu gostei logo de cara. Eram os Fradinhos. Confesso que as maldades do Baixinho muitas vezes me arrepiavam. Sádico total ahahahahahahah. Mas tão engraçado e aquelas rodinhas, quase perninhas correndo. No cravo e na ferradura, uma peste verdadeira!!!

3- O que chamou mais a atenção o humor escroto, as gags visuais ou o traço?

Acho que não dá pra separar. Mas acho admirável, sempre que encontro em qualquer trabalho- desenho, escrita, pintura, música, dança, – um estilo, que é só você olhar nem precisa de assinatura. Tá lá, é o fulano, a fulana. Taí. É o Henfil!

4- Seu trabalho teve influência direta? Se teve, em que sentido?

Acho que essa pergunta é mais para os artistas do traço aqui. Eu sou da pena. Sou uma receptora e serviu no mínimo para abrir minha mente em relação à importância dessa arte para a denúncia, a conscientização, a resistência!

5-Qual foi o impacto dos quadrinhos e charges do Henfil na imprensa sindical? E na esquerda? Entre seus amigos? Quais eram os comentários das pessoas?

Ah a imprensa sindical! Vou contar uma historinha: foi minha melhor experiência na carreira jornalística, verdade! Embora breve, intensa. Na implantação do Departamento de Imprensa no Sindicato dos Bancários de SP, que recém havia expulsado os pelegos, 1980 por aí. Então já havia a experiência do Pasquim. Tinha como prato principal basicamente cartunistas e chargistas. Porque até então os jornalões reservavam mínimo espaço para o traço. E quando havia era pra quadrinhos estadunidenses, que durante anos e até recentemente mantiveram. Estadão não sei se ainda tem, mas periga. Nunca que eu saiba esse jornal teve quadrinho nacional. Mas uma época, mais recente, abriu a página de opinião para dois cartunistas. Bom, com as experiências da imprensa alternativa, então, Pasquim, Opinião, depois Movimento e uma miríade de nanicos, viu-se a importância do traço. E a nova imprensa sindical convocou o pessoal. Nos Bancários tivemos o Éton, nos Químicos o Bira Dantas, discípulo do Éton, garotinho. E nos Metalúrgicos do ABC o Vargas (que desenhava o João Ferrador), e em tantos em todo o país começaram a provar a importância do desenho para capturar, em primeiro lugar, o olhar do trabalhador. Creio que todos esses profissionais tiveram influência diretíssima do Henfil. Não foi fácil ocupar esse espaço. Eu me lembro nos Bancários de gente que dizia que o Departamento de Imprensa não trabalhava. Um -diziam- ficava ouvindo rádio e rabiscando, o Éton. Ah, vou aproveitar para falar sobre a preponderância do texto escrito sobre o traço. A única experiência na história da imprensa que deu ao desenho e à foto, a partir de 1956, sua autonomia e pagou as colaborações no mesmo valor que os autores de textos foi o Suplemento Cultural do Estadão criado pelo professor Antônio Candido e editado por Décio de Almeida Prado. Escrevi um livro sobre, com reproduções de todos e ilustrações- Suplemento Literário. Que falta ele faz! Porque o desenho está sempre subordinado ao texto, ele vem para ilustrar o que o texto diz. Lá, inúmeras vezes um belíssimo desenho pousava solto na página. E mais: o projeto do professor Antonio Candido para os donos do Estadão contemplava pagamento igual para texto e ilustração. Certamente foi a primeira vez na história da imprensa. E infelizmente, quando acabou a primeira fase brilhante do Suplemento, também acabou essa estratégia. Não tinha anúncios, e então… Bom, mas na década de 80 uma briga era, pelo menos nos Bancários, para cada tendência de esquerda representada, passar a pauta ao ilustrador, isto é dizer como devia ser seu desenho, o que desenhar. Não estavam acostumados a deixar livre os meninos para a imaginação. Aliás, meninos sim, porque eram todos homens. Ainda não havia meninas. Eu sempre batalhei pela independência do trabalho dos chargistas e ilustradores, quando fui editora nessas publicações. Isso significava enfrentamentos com os diretores sindicais. Mas afinal a gente ganhava. Com o tempo perceberam o sucesso das charges na Folhinha Bancaria diária. A importância que tinha essa linguagem e como chegava direto aos trabalhadores. Estávamos em sindicatos do chamado novo sindicalismo e estouravam as greves iniciadas pelos metalúrgicos em 79. Boletins, panfletos, filipetas, tudo enfim era ilustrado, E precisava ser. E passava a ser fundamental. Quantos jornais da oposição sindical, quanto material se rodava. Quantos jornais e quantas experiencias importantes e pioneiras. Claro que todo mundo, da pena e do traço, era fã do Henfil. Seu trabalho, se não era encomendado diretamente, porque ele já estava cheio de trabalho, era publicado, republicado, replicado. Henfil já estava no TV Mulher, criado pela jornalista de esquerda e ex-presa política Rose Nogueira. Imaginem Henfil na Globo! Quem imaginaria? Não me lembro de jamais ter ouvido comentários desgostando de Henfil, pelo menos no nosso meio. Respeito e admiração ao seu trabalho era o que existia. Também Henfil contribuiu exatamente para que o trabalho de desenhistas, chargistas, ilustradores, fosse mais considerado. Já na época não se imaginava um jornal de sindicato sem ilustração. O espaço já estava conquistado.

6- Acompanhava as entrevistas do Henfil na imprensa?

Lia tudo. Mas minha memória não chega a lembrar e discriminar alguma. Eu lia semanalmente também as Cartas à Mae, que eram deliciosas.

7-O que achou da Editora Noir em reunir estas entrevistas em um livro? Que efeito acha que este livro terá em você e nos demais leitores?

Esse livro será fundamental para puxar a memória e lembrar tudo aquilo que conhecemos do HEnfil. E nos demais leitores, especialmente as gerações mais jovens, aqueles que já desenham, os que vão desenhar, os que vão escrever ou não, uma contribuição histórica importante. Fundamental presença na cultura brasileira de resistência à ditadura, será útil principalmente para que se conheça essa página infeliz da nossa História. Que se tornou menos insuportável graças aos desenhistas, principalmente o mais famoso deles, Henfil.

8- Henfil era um profissional de multimidia atuando na TV e no cinema, o que achou das produções do cartunista em TV Home e Tanga, deu no New York Times?

Eu me lembro de Tanga. Acho que foi o mais famoso, E essa frase “deu no NYT” ficou para sempre cravada como uma crítica à subserviência colonizada.

9-Pra você qual é o tamanho da falta que Henfil faz?

Adoraria continuar contando com as novas charges do Henfil. É imensurável a falta que ele faz! Nossa cultura tão esfacelada pelos ditadores! Nossos artistas talentosos, decentes, que nunca venderam a alma, resistentes sempre nadaram contra a corrente da indústria de massas. São eles que ficarão. Viverão para sempre, voltarão e vencerão.

10- As novas gerações conhecem pouco o trabalho de Henfil. Apesar de uma exposição de originais no Centro Cultural Banco do Brasil (2005) no Rio e em SP ter tido público recorde na época, o trabalho dele (apesar do enorme esforço do Instituto Henfil, criado pelo filho Ivan Cosenza) ainda é pouco compartilhado nas redes. O que fazer para melhorar isso? O livro organizado pelo Gonçalo Jr. Pode ajudar?

Não é só neste caso, as novas gerações não têm acesso a nossa historia, quiçá à historia da cultura brasileira. Claro que sim. E é preciso agilizar o compartilhamento de Henfil nas redes, a divulgação para quem não conhece. Já surgem o Bode Zeferino, Graúna e Orelana na eternamente, inesquecível: Tão vendo alguma esperança? Neste 2022 com pandemia e genocida no poder. Criar e vivificar a memória de Henfil, vocês já estão contribuindo. Vamos em frente!

11- O Brasil hoje está sick da vida com tantos ataques à democracia, à inclusão social, racial e de gênero, a distribuição de renda. Ou a cosia precisa piorar mais pro povo reagir?

Acho que finalmente está começando a reação. Escrevo em janeiro de 2022. A falecida sociedade civil está acordando, mas não se sabe o que será.

12- Como Henfil estaria reagindo à sanha fascista, totalitária e antidemocrática que abocanhou os três poderes?

Nem sei como Henfil faria com tanto assunto, tanto absurdo diuturno. Tanto sofrimento, tanta dor, tanta fome, tanto horror. Ele saberia.

13-Henfil foi um dos fundadores do PT, que se propunha a transformar radicalmente a sociedade. Esta 13ª pergunta é o espaço para suas considerações, não finais, mas futuristas. É possível transformar ainda o país de modo radical? O humor entra nisso?

É sempre possível e é nosso dever sempre lutar para mudar um mundo de injustiças. A luta é eterna, ela sempre continuará. Mas no nosso país, que já tinha conquistado tanto, mesmo ainda com tanto a conquistar, e foi invadido por legiões barbaras. No nosso país temos de expulsar esses bárbaros, temos de reconstruir o que destruíram, temos de sanar tantas chagas, temos de reviver nossos sonhos. Vamos precisar de todo mundo. E a consciência que se desperta com humor é mais pedagógica. Não se vive sem humor/amor. Um binômio ótimo. A América Latina retoma governos de tradição democrática e o Brasil também retomará. Não será fácil o resgate. Mas venceremos!

QUEM É ELIZABETH LORENZOTTI

Nasceu em São Paulo, graduada em Jornalismo (1975) e mestre em Ciências da Comunicação pela Escola de Comunicação e Artes da USP (2002) com a defesa do tema Do artístico ao jornalístico: vida e morte de um Suplemento-Suplemento Literário, de O Estado de S. Paulo (1956 a 1974). Iniciou a trajetória na imprensa na Agência Estado como Redatora. Antes fez estágio nos Diários Associados e trabalhou na sucursal paulista de O Globo. Em 1980 participou da implantação do Departamento de Imprensa no Sindicato dos Bancários de São Paulo, onde editou o Suplemento Diário da Folha Bancaria que passou incialmente de mil para 10 mil exemplares em poucos meses e chegou a 100 mil nos anos posteriores. Era um instrumento de informação e conscientização, distribuído pela diretoria e militantes aos bancários em seus locais de trabalho. Foi editora da revista Carícia, da Editora Azul, empresa subsidiária da Editora Abril; editora assistente da Folha de S. Paulo e editora do Guia do Estudante na Editora Abril. Foi editora-chefe do Jornal da USP e repórter de política do jornal digital Panorama Brasil. Editora da revista Nova Escola, da Fundação Victor Civita (Editora Abril) e no Grupo Estado, editora-assistente das editorias de Geral e Educação. Na Revista do IDEC, focada sobre direitos do consumidor, foi Diretora de Redação por quatro anos. Fez reportagens sobre arte, literatura, arquitetura e design para a revista Bienart, da Fundação Bienal de São Paulo; colaborações para o Suplemento Fim de Semana, (suplemento cultura do jornal Valor Econômico). Editora da revista Nova Escola, da Fundação Victor Civita (Editora Abril). Também foi editora de revista Panorama Editorial, da Câmara Brasileira do Livro. Foi colaboradora da revista Sem Terra, do MST, desde sua fundação e durante vários anos. Na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC) foi professora auxiliar de ensino de técnicas de jornalismo para alunos de quinto a oitavo semestres do curso de Jornalismo. Ainda na PUCSP- Professora da Cogeae (Coordenadoria Geral de Especialização e Extensão), do Programa de Pós-Graduação Lato-Sensu em Comunicação Jornalística no Curso de Jornalismo Institucional e Públicos Estratégicos. Na Universidade Metodista, professora do curso de Jornalismo Cultural no programa de pós-graduação lato-sensu no Curso de Jornalismo, História e Literatura. Em 2007 lançou o livro Suplemento Literário – Que Falta ele faz (ensaio), em 2010 Tinhorão, o Legendário (biografia), ambos pela Imprensa Oficial do Estado de São Paulo e As Dez Mil Coisas, 2011 (poesia) pela Biblos Editora para Amazon.com. Lançou o ebook Jornalismo Século XXI- O modelo #mídiaNINJA, em agosto de 2014, pela e-galaxia. A obra narra a trajetória da Mídia Ninja, coletivo midialivrista que provocou polêmica no establishment da comunicação. Em 2021 participou de coletânea de crônicas publicadas por jornalistas no Escritablog -Um mar vivo de corações expostos- pela Editora Lavra.

Elizabeth Lorenzotti mantém o blog VivaBabel focado em Cultura e literatura.

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AQC entrevista: Desenhos do Nando sobre Henfil

Esta série de entrevistas foi uma iniciativa da AQC em apoio ao livro “Sick da Vida”, coletânea de entrevistas do cartunista Henfil organizadas pelo quadrinhista, jornalista, escritor e biógrafo Gonçalo Silva Junior. O livro foi lançado na plataforma Catarse pela Editora Noir, recebeu mais de 230 apoios e ultrapassou a meta para publicação em 44%, comprovando que as ideias do cartunista Henfil propagadas em suas entrevistas continuam sendo atuais e esclarecedoras. A AQC se sente orgulhosa de ter apoiado uma iniciativa tão incrível e necessária.https://www.catarse.me/henfil Você pode ter mais informações sobre como adquirir o livro através do site https://editoranoir.com/ ou da página do Facebook: https://www.facebook.com/editoranoir/

1. Como você conheceu o trabalho do Henfil?

Conheci por volta dos meus oito ou nove anos, em 1988 ou 89. Meu pai tinha uma namorada viciada em quadrinhos políticos e tinha uma coleção seleta. Foi quando conheci Quino, Laerte, Angeli e o resto todo da turma.

2. Qual foi o impacto inicial?

Eu achei o traço muito interessante e mesmo não entendendo tanto o contexto, por causa da idade, eu achava divertido. Um bode, dois frades e um bicho preto, que eu não fazia ideia do que fosse. Hoje sei se tratar da Graúna, rs.

3. O que chamou mais atenção o humor escrito, as gags visuais ou o traço?

Chamou atenção o traço rápido e sem rascunho.

4. Seu trabalho teve influência direta? Se teve, em que sentido?

Henfil é influência direta de nove entre dez cartunistas. Quem não teve influência dele não entendeu nada. O Henfil sabia usar o humor pra desnudar a hipocrisia de uma parte da sociedade, dos militares/políticos e dos milionários/empresários. A charge bem feita tem a característica de provocar e incomodar, tanto que muitos sofreram perseguições brabas.

5. Qual foi a impacto dos Quadrinhos e Charges do Henfil na Imprensa Sindical? E na esquerda? E entre seus amigos? Quais eram os comentários das pessoas?

Infelizmente minha ignorância me impede de tecer comentários acerca do impacto dos quadrinhos na imprensa sindical. Na esquerda, eu suponho que tenha sido um dos fatores de aglutinação de ideias. As vezes, o poder de síntese de uma charge consegue representar o pensamento de muitas pessoas e serve como ferramenta pra fortalecer argumentos dentro de uma disputa narrativa. Meus amigos são fãs de Henfil, assim como eu.

6. Acompanhava as entrevistas do Henfil na Imprensa? Teve alguma que lhe marcou? Porquê?

Já vi alguns trechos, mas confesso não ter nenhuma que eu possa citar.

7. O que achou da iniciativa da Editora Noir em reunir estas entrevistas em um livro? Que efeito acha que este livro terá em você e nos demais leitores?

Acho uma ótima oportunidade pra pessoas como eu conhecerem melhor a palavra falada desse cartunista genial. Acho que o impacto será grande, já que vivemos momentos similares aos da época da ditadura de 64.

8. Henfil era um profissional multimídia, atuando na TV e no Cinema. O que achou das produções do cartunista em TV Home e Tanga, deu no New York Times?

Eu vou pesquisar essas produções pra TV, pois desconheço.

9. Pra você, qual é o tamanho da falta que Henfil faz?

O tamanho da necessidade que estamos tendo nesse momento crucial da nossa história. Pessoas como ele são fundamentais na provocação dos debates.

10. As novas gerações conhecem pouco do trabalho do Henfil. Apesar de uma exposição de originais no Centro Cultural Banco do Brasil (2005) no Rio e em SP ter tido público recorde na época, o trabalho dele (apesar do enorme esforço do Instituto Henfil, criado pelo filho Ivan Cosenza) ainda é pouco compartilhado nas redes. O que fazer pra melhorar isso? O livro organizado pelo Gonçalo Jr pode ajudar?

Certamente o livro irá ajudar. Me comprometo a divulgar nas minhas redes, inclusive. Vou perturbar alguns amigos cartunistas pra divulgarem também.

11. O Brasil hoje está ‘sick da vida’ com tantos ataques à democracia, à inclusão social, racial e de gênero, à distribuição de renda? Você, bem como Aroeira, Laerte e mais cartunistas tem sido ameaçado por defensores do governo federal. Pode fazer um paralelo entre essas ameaças e a censura nos tempos da ditadura?

Existem muitas semelhanças, como o autoritarismo e a doutrinação das pessoas por parte do governo. Mas, hoje em dia, temos uma diferença importante -ao meu ver- que é a internet. Na rede podemos nos organizar em pouco tempo pra revidar e expor ataques.

12. Como Henfil estaria reagindo à sanha fascista, totalitária e anti-democrática que abocanhou os três poderes?

Estaria reagindo como um cidadão indignado e certamente sua caneta estaria desenhando críticas ácidas e bem humoradas, dentro do possível.

13. Henfil foi um dos fundadores do PT, que se propunha a transformar radicalmente a sociedade. Esta décima terceira pergunta é o espaço pra suas considerações, não finais, mas futuristas. É possível ainda transformar o país de forma radical? O humor entra nisso de que jeito?

Acredito que a maioria da população entendeu o perigo que esse tipo de governo representa. Não à toa, temos muitos líderes de extrema direita caindo. O Lula tá liderando com folga as pesquisas por aqui e tem tudo pra levar essa no primeiro turno. Espero que a partir daí, tenhamos um caminho de reconstrução e fortalecimento da nossas instituições. Sou otimista e acredito que o Brasil vai voltar a ser feliz.

QUEM É NANDO MOTTA

Músico, ator e ilustrador, Nando é um carioca que vive de arte desde 1997. Como cantor, compositor e instrumentista, passou por algumas bandas, fez shows em Portugal e Paris, gravou dois discos autorais e passou pelo The Voice Brasil 2013. No teatro, participou da montagem de ‘O Homem de la Mancha’, com direção de Miguel Falabella e outras grandes produções musicais como ‘Rio Mais Brasil’ e ‘70? Doc Musical’. Como ilustrador, desenhou diversos livros didáticos, institucionais, storyboards e concept art de algumas campanhas publicitárias. Mas foi a partir de 2018 que Nando começou de fato na carreira de chargista, tendo seus primeiros trabalhos publicados no portal Brasil 247 – o maior portal jornalístico progressista na internet brasileira – e a partir daí sua produção começou a ganhar repercussão nacional. Recentemente teve um de seus trabalhos mencionados numa matéria do NYTIMES, acerca do episódio sobre a perseguição política aos chargistas e também concedeu uma entrevista para a Rolling Stone Brasil, ao lado da consagrada chargista Laerte. A produção diária e ininterrupta de Nando chama atenção pelo traço e pelas mensagens contidas, que fazem com que seus números nas redes sociais cresçam de maneira exponencial. Como chargista é colaborador do site Brasil 247. Está sendo processsado por Luciano Hang, conhecido como ‘Véio da Havan’, por causa de uma charge publicada no site. Isto gerou mais uma ‘charge continuada’ (aos moldes de Aroeira ameaçado pelo ministro da justiça com a Lei de Segurança Nacional) pelos solidários cartunistas da Revista Pirralha, que saíram em sua defesa. https://revistapirralha.com.br/

Portfólio de charges:

https://www.brasil247.com/authors/nando-motta

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https://www.instagram.com/desenhosdonando/

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AQC entrevista: Brum

Esta série de entrevistas é uma iniciativa da AQC em apoio ao livro “Sick da Vida”, coletânea de entrevistas do cartunista Henfil organizadas pelo quadrinhista, jornalista, escritor e biógrafo Gonçalo Silva Junior. O livro foi lançado na plataforma Catarse pela Editora Noir. Por isso, pedimos que você apoie, compartilhe e comente. https://www.catarse.me/henfil

1. Como você conheceu o trabalho do Henfil?

Desde que me entendo por gente admiro cartuns, então, provavelmente já havia visto coisas do Henfil só que não tinha a menor ideia de quem era. Era mais um no meio de tantos “desenhos divertidos” que eu ficava admirando. Eu não entendia o que me atraia nesse tipo de desenho, nem tinha maturidade para entender nada. Eu era muito novo. Tinha uns 11 anos quando ele faleceu. Daí quando que tinha uns 16 ou 17 anos, um amigo mais velho, Vital Filho, me presenteou com sua coleção do Fradim. Devo ter devorado a coleção umas duas ou três vezes seguidas, maravilhado com aquele trabalho, com aquele humor/critica porrada. A cabeça deu um looping, não só na forma de ver os cartuns, mas na maneira de ver os acontecimentos ao meu redor. Desde então comecei a pesquisar mais sobre Henfil e tudo relacionado a ele. Comecei a procurar seus cartuns e quando deparei já era um fã clube de uma pessoa só, com direito a tatuagem no braço. Tanto que até hoje, volta e meia a coleção sai da estante e vai pra minha mesa, pra mais uma das milhares de releituras já feitas.

2. Qual foi o impacto?

Talvez o maior impacto relacionado a minha área de trabalho. Eu já era fã de gênios como a Laerte, o Angeli, o Glauco, que me inspiraram a ser cartunista. Mas o Henfil entrou como uma “voadora nos peito”. Tinha críticas ali de anos, mas que eu lia e parecia que tinha acabado de ser feito tal a sua força…e hoje, quase 30 anos depois de ter esse primeiro impacto, a sensação continua a mesma. Mudou totalmente minha forma de ver essa arte, aliás, não só essa arte, como eu já disse anteriormente, mudou a forma de ver o que acontecia ao meu redor. A partir dali eu vi que a crítica, a porrada é o que importa, muito mais do que desenhos super bem elaborados e cheios de acabamento. Ví o que realmente importa para um trabalho de charge ser bem feito. Vi que a risada é apenas um recurso pra prender a atenção do leitor, mas nem de perto é o objetivo final dessa forma de desenho.

3. O que chamou mais atenção o humor escrito, as gags visuais ou o traço?

A força crítica e atemporal que seus rabiscos rápidos traziam. O como seus poucos traços fazia o leitor refletir, se sentir atingido com determinada situação e se sentir incomodado de ficar calado, sem fazer nada, diante de tais realidades desenhadas. 4. Seu trabalho teve influência direta? Se teve, em que sentido? R: Com certeza. Antes eu achava que tinha que ser mais “desenhista”, depois do Henfil, eu vi que não era bem isso. Claro que um bom desenho faz parte do nosso trabalho, claro que temos que aperfeiçoar esta arte cada vez mais, mas o principal é a mensagem, é que temos que comprar briga com o que tá errado, temos que incomodar, “gritar com os nossos rabiscos”, dar voz pra um monte de gente que não tem como se manifestar, temos que meter o dedo na ferida, sermos oposição no sentido da cobrança ferrenha que essa palavra carrega.. Vi que o chargista, mesmo usando o humor como recurso pra chamar a atenção, nem de longe é um humorista gráfico. O chargista é um crítico, um contator das mazelas e provocador para que algo deve ser mudado, corrigido. O importante é expor esses fatos, mesmo que isso faça com que muita gente fique contra nós. Que se dane, nossa função não é conseguir likes, e sim, gerar o debate necessário.

5. Qual foi a impacto dos Quadrinhos e Charges do Henfil na Imprensa Sindical? E na esquerda? E entre seus amigos? Quais eram os comentários das pessoas?

Ter uma voz como a do Henfil nesses campos foi de uma relevância enorme. Quantas vezes a esquerda e a imprensa sindical só foram ouvidas por conta dos seus traços? Estamos falando de uma época que o alcance dos trabalhos, do que queríamos falar, não era tão grande e facilitado quanto hoje, na era das redes sociais. Tinha que ser algo muito impactante pra romper certas barreiras. Impactante, inteligente e acima de tudo humano. E o Henfil rompia todas as barreiras, e com isso a voz sindical e da esquerda era escutada numa magnitude surreal para a sua época. A sua militância serviu (e servem) de inspiração para que muitos seguissem os seus passos. Entre os meus amigos, todos que vieram, assim como eu, a conhecer seus trabalhos anos após a sua morte, são unanimes nos comentários positivos. Se não conseguem render comentários positivos com o seu trabalho, acho quase que impossível estarem na minha roda de amizade.

6. Acompanhava as entrevistas do Henfil na Imprensa? Teve alguma que lhe marcou? Porquê?

Fui acompanhar bem depois de sua morte, nos livros, na internet. A sua entrevista ao Tarik de Souza, que até rendeu um livro é uma verdadeira aula. Mas confesso que nada me causou mais impacto do que o livro O Rebelde do Traço, do Denis Moraes. Me marcou muito. Não só pelas histórias sobre a vida do Henfil, mas também pela forma que percebi que a sua vida estava diretamente ligada à atual democracia que vivemos, o quanto não podemos falar de uma coisa sem falar de outra. O quanto o Henfil é muito maior que o seu trabalho, e olha que tá pra nascer um chargista com um trabalho tão gigante quanto o dele.

7. O que achou da iniciativa da Editora Noir em reunir estas entrevistas em um livro? Que efeito acha que este livro terá em você e nos demais leitores?

Eu sou suspeito falar. Como disse. Devoro tudo que tem o nome do Henfil envolvido. Que bom que essa iniciativa foi tomada. O impacto em mim, com certeza será positivo. Tudo que leio sobre ele me trás algum ensinamento, algo a acrescentar. Espero que cause o mesmo nos outros leitores.

8. Henfil era um profissional multimídia, atuando na TV e no Cinema. O que achou das produções do cartunista em TV Home e Tanga, deu no New York Times?

Curto tudo que tem Henfil envolvido, e no caso de Tanga, tem um gostinho a mais, tem o Flavio Migliaccio no elenco: juntou o muito bom com o bom demais. Acho que nós chargistas deveríamos seguir o exemplo desse pioneirismo que o Henfil tinha e começarmos a usar nossas críticas em outras formas de mídia. Facilidade pra isso, nem se compara com a que ele teve quando meteu a cara nesses novos campos.

9. Pra você, qual é o tamanho da falta que Henfil faz?

Tem nem como medir essa falta. É algo gigantesco. Imagine aí o Henfil frente a este governo? Aliás, será que teríamos este governo se o Henfil ainda fosse vivo? Quantas pessoas não teriam outra atitude nas eleições que elegeram o atual governo se Henfil fosse vivo? Ele era um grande formador de opinião. Já pensou no Henfil em tempos de redes sociais? A vida que os seus personagens teriam com a tecnologia atual? O alcance das suas ideias nos dias de hoje? Com certeza muita coisa seria diferente. Pra melhor! Por sorte seu trabalho é atemporal, não morreu.

10. As novas gerações conhecem pouco do trabalho do Henfil. Apesar de uma exposição de originais no Centro Cultural Banco do Brasil (2005) no Rio e em SP ter tido público recorde na época. O que fazer pra melhorar isso? O livro organizado pelo Gonçalo Jr pode ajudar?

Com certeza pode. Eu acho que o Henfil merecia mais reconhecimento, mais divulgação da sua arte. Ferramenta e matéria-prima pra isso nós temos demais, mas sinto que ainda fica restrito a nossa bolha, infelizmente. Uma vez fui sugerir à um jornalista de cultura que fizesse uma matéria especial sobre o Henfil, e a resposta que eu tive foi um questionamento, me perguntando em que banda o Henfil tocava. É essa a realidade. Vivemos num país que não valoriza sua cultura e nem o seu povo. Morreu, é apagado, que se dane o tamanho da sua obra e dos seus feitos. O que fazer pra melhorar isso? Todo um trabalho educacional desde lá de baixo, de criança, mostrando a importância da história do nosso país e do nosso povo.

11. O Brasil hoje está ‘sick da vida’ com tantos ataques à democracia, à inclusão social, racial e de gênero, à distribuição de renda? Ou a coisa precisa piorar mais pro povo reagir?

Se piorar fudeu! Pior que se tratando de Brasil, tudo pode piorar. Já passou da hora do povo reagir.

12. Como Henfil estaria reagindo à sanha fascista, totalitária e anti-democrática que abocanhou os três poderes?

Ele estaria rabiscando feito um louco. Dominando toda tecnologia e novas formas de mídia pra mandar o seu recado. Estaria fazendo barulho, iniciando movimentos, puto com a passividade que as vezes vejo no povo diante de tanta merda. O cemitério dos mortos-vivos estaria lotado, enterrando gente de pé pra caber mais elementos.

13. Henfil foi um dos fundadores do PT, que se propunha a transformar radicalmente a sociedade. Esta décima terceira pergunta é o espaço pra suas considerações, não finais, mas futuristas. É possível ainda transformar o país de forma radical? O humor entra nisso?

Se eu não acreditasse nessa possível transformação eu largava as charges. Ainda faço porque acredito nisso. E só por isso. Ela não me traz um conforto financeiro, não me traz uma estabilidade profissional, não me traz fama, amizades, nada. Pelo contrário, estamos cada vez mais desvalorizados no mercado. Foi-se o tempo que os chargistas tinham esse lado positivo. Mas ainda temos a certeza desse poder transformador que o pensamento crítico pode trazer. E o humor, a charge ainda são armas poderosas em despertar esse tipo de pensamento. Ainda incomodam os poderosos, pois eles sabem que quanto mais o povo pensa, quanto mais o povo debate, mais difícil fica manipular a massa. Tanto que volta e meia vemos gente muito poderosa, como o próprio presidente, usando leis da época da ditadura pra tentar calar chargistas. Então, enquanto o lápis tiver ponta, eu vou tá rabiscando na esperança de mudar alguma coisa e deixar um lugar bem melhor pras minhas filhas.

QUEM É RODRIGO BRUM

Natural de Maricá-RJ. Formado em publicidade pela ESPM com especialização em direção de arte e redação. Discípulo de Daniel Azulay e fã de carteirinha da Laerte, Angeli e Henfil. Começou no mercado de cartuns fazendo caricaturas ao vivo em eventos. Atualmente mora no Rio Grande do Norte, onde passou por diversos jornais do Estado e hoje, além de atuar como diretor de arte, faz as charges diárias do jornal Tribuna do Norte, do jornal do Sindicato dos Bancários do RN e do jornal televisivo Bora RN (TV Band-RN). Participante de diversos salões de humor e exposições nacionais e internacionais. Ilustrador, quadrinista e ex-colaborador da revista MAD, tendo lançado diversos livros quadrinhos e charges. Vencedor do prêmio Angelo Agostini como melhor cartunista de 2015; vencedor do Prêmio Vladimir Herzog de Anistia e Direitos Humanos em 2016 e 2018 na categoria artes, segundo lugar no concurso de cartum “Nova Previdência Social: Melhor para quem?” em 2019, um dos 10 selecionados para o edital de cartuns antirracistas promovido pela ARTIGO 19 e Coalizão Negra por Direitos em 2020 e um dos vencedores do “Prêmio de Destaque Vladimir Herzog Continuado” em 2020 com o movimento #somostodosaroeira. Membro da Revista Pirralha. https://revistapirralha.com.br/

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AQC entrevista: Adriano Diogo sobre Henfil

Esta série de entrevistas é uma iniciativa da AQC em apoio ao livro “Sick da Vida”, coletânea de entrevistas do cartunista Henfil organizadas pelo quadrinhista, jornalista, escritor e biógrafo Gonçalo Silva Jr. O livro foi lançado na plataforma Catarse pela Editora Noir. Por isso, pedimos que você apoie, compartilhe e comente. https://www.catarse.me/henfil

1. Como você conheceu o trabalho do Henfil?

Eu comecei a ter contato com o trabalho do Henfil nas primeiras edições do jornal O Pasquim. Entrei na USP em 1969, não lembro direito quando o Pasquim foi fundado, só sei que era distribuído nos centros acadêmicos da USP quase escondido, como se fosse um panfleto proibido com aquela diagramação… e aí comecei a conhecer o Henfil. Na realidade conheci o Henfil, o Jaguar, o Ziraldo era um pouco mais conhecido; mais as coisas do Ziraldo, do Zélio e da Ciça. Tinha o Fradão e o Fradinho (Comprido e Baixim), então aqueles personagens do Henfil. Já começava a falar da ditadura, ilustrava aquelas enormes entrevistas do Pasquim. Lógico que eu sabia que ele irmão do Betinho e andavam militando em Santo André, na clandestinidade. Eu sabia que eram mineiros e comecei a ler tudo sobre o Henfil e me impressionou muito. Na nossa escola nós recortávamos o Pasquim para fazer mural, jornalzinho, era muito interessante.

2. Qual foi o impacto inicial?

O impacto inicial foi muito forte, porque era toda uma linguagem, uma estética nova e tinha aquele negócio do sadismo, do top top, da introdução do palavrão, era uma revolução. Cada um tinha um estilo, mas o Henfil era o mais revolucionário, mais impressionante, aquele traço fino parecia coisa do Picasso.

3. O que chamou mais atenção o humor escrito, as gags visuais ou o traço?

A terceira pergunta é mais ou menos isso, as tags visuais, o conceito, o conceito do exagero, do cara “se foder”, do “cara se estrepar”, não tinha dó, era o escárnio, um afrontamento direto à ditadura e aos militares, as coisas absurdas, depois a introdução à Leila Diniz, do nu, do palavrão, a denúncia do tropicalismo, do exílio, dos novos baianos, começou a falar da droga também, da liberdade de usar a maconha. Era tanta coisa diferente, eu na minha cultura de um cara suburbano que vinha da periferia da Zona Leste, foi um impacto impressionante.

4. Seu trabalho teve influência direta? Se teve, em que sentido?

Se o trabalho teve uma influência direta? Sem dúvida. Eu comecei minha militância em 1963, estudava na Mooca, no Firmino de Proença, teve os jogos pan-americanos aqui em São Paulo, fui expulso da escola que estudava e passei a trabalhar no movimento secundarista e entrei na faculdade só em 69. Eu era da esquerda bem hard, bem periferia, adepto do Lamarca, do Marighela. Lógico que vim de Geraldo Vandré a Caetano Veloso, passando pelo Chico, então, esse trabalho era muito moderno. Agora na minha escola, na Geologia da USP, onde o pessoal adorava arte gráfica, o Pasquim era bebido, cara, e disputada aos tapas para comprar, mas distribuíam de graça. Então o Henfil começou a criar uma estética dos jornais do movimento estudantil, da igreja de esquerda. Quando você fala dos sindicatos, eu acho que tinha mais movimento de bairro, mais de comunidade, porque o Henfil era um filho da igreja católica, o irmão dele que veio de movimento de juventude, o Betinho, que o pessoal conhece mais da campanha contra a fome, mas eles eram da AP, da Ação Popular, oriundos de movimento da juventude universitária católica. A questão da hemofilia era uma história incrível. Lógico que foi imortalizado pela canção da Elis Regina, mas na época da anistia, 10 anos depois, com a volta do irmão do Henfil. O Henfil ajudou muito na formação do PT. Nessa época, aparecia muito gente de desenho em quadrinho, da Mafalda, que veio da Argentina, muita coisa do exterior, lembro que vinha coisa do Claudius, enfim, o quadrinho todo mundo lia, as tiras da Folha, tinha vários cartunistas, por exemplo, o pai da Laert, o Coutinho, era meu professor na geologia, a gente bebia das tiras, principalmente das tiras da Folha, mas o Pasquim era a verdadeira revolução cultural, gráfica.

5. Qual foi a impacto dos Quadrinhos e Charges do Henfil na Imprensa Sindical? E na esquerda?

Não sei bem da imprensa sindical, eu acompanhava mais o jornal Movimento, Opinião, o Em Tempo, foi uma revolução em toda a imprensa da esquerda influenciada pelo Henfil. Todo mundo queria saber qual era a última entrevista, a última fala, tinha uma época que ele falava das pessoas que morriam em vida, ele falava dos túmulos que os caras que falavam bobagem; puseram até a Clara Nunes uma vez, a Elis Regina também foi marcada como morta em vida, pessoas de esquerda que desbundavam. Tanto que a Elis, quando grava a música “O bêbado e o equilibrista”, para se redimir de uma besteira que ela fez ao cantar para os militares. No meu meio, era como se gente estivesse falando de Picasso. Nós achamos que o Henfil tinha a mesma importância que o Picasso tinha quando ele desenhou a Guernica, tal a importância que ele teve para a arte e estética brasileiras. Eu colecionava todos os jornais do Pasquim e tudo que o Henfil falava era uma coisa ultrapreservada, como ele enfrentava os militares, a ditadura, era muito diferenciado, moderno e corajoso. Era como se fosse a geração do cinema novo, por exemplo, o Tropicalismo, o Caetano, o Gil, Torquato, Gal, tinham uma restrição, como se fossem desbundados, já era uma geração que vinha adiante, do Geraldo Vandré, daquela coisa mais tradicional da música popular brasileira, os festivais de música, o Henfil era uma revolução conceitual, transformadora, definitiva, socialista, falava da questão da luta armada que era uma coisa ultraproibida com a maior naturalidade, do Sérgio Ricardo, do Glauber.

6. O que achou da iniciativa da Editora Noir em reunir estas entrevistas em um livro? Que efeito acha que este livro terá em você e nos demais leitores?

Achei importantíssima essa atitude da editora Noir em colecionar as entrevistas, principalmente para as novas gerações que conhecem muito pouco da obra e da importância do Henfil. Eu beberia essas edições todas e recomendaria até para os meus netos.

7. Henfil era um profissional multimídia, atuando na TV e no Cinema. O que achou das produções do cartunista em TV Home e Tanga, deu no New York Times?

Ele era REALMENTE um profissional multimídia, conseguiu entrar na televisão apesar de toda a censura, deu até no New York Times que era a coisa mais impressionante. Depois também as coisas do cinema, da retrospectiva do Henfil, aí começou a mudar muito, a atualizar, eu fui perdendo o contato, o meu contato foi mais até 69, 73, até a minha prisão. Depois não acompanhei mais, mudei de foco e o Pasquim também. Embora Henfil tenha entrado até nos meios de comunicação, na grande mídia, perdi esse contato.

8. Pra você, qual é o tamanho da falta que Henfil faz?

O Henfil é um personagem da humanidade e sua falta é terrível. Até as pessoas costumam dizer que não saberiam dizer o que foi a segunda guerra mundial se não fosse o Picasso e eu não teria problema nenhum em dizer que a gente não saberia o que foi a ditadura militar no Brasil se não fosse o Henfil, tão importante quanto Marighela, Lamarca e qualquer outro revolucionário, foi um revolucionário na arte da estética como o Glauber, Leila Diniz, Grande Otelo, Dina Sfat, Rogério Sganzerla, um gênio, era tudo isso e um pouco mais.

9. As novas gerações conhecem pouco do trabalho do Henfil. Apesar de uma exposição de originais no Centro Cultural Banco do Brasil (2005) no Rio e em SP ter tido público recorde na época, o trabalho dele ainda é pouco compartilhado nas redes. O que fazer pra melhorar isso? O livro organizado pelo Gonçalo Jr pode ajudar?

O livro pode ajudar, mas tem que haver uma reinserção. Veja a Mafalda, ela é eterna, do jeito que ela é colocada ela é atemporal, deveria ter um esforço para recolocar o Henfil não só no passado, mas também no presente. Ninguém vive só do passado, imagina o Henfil enfrentando o bolsonarismo, que coisa espetacular! Essa transposição temporal que é necessário fazer. Porque aqui no Brasil o que acontece é o seguinte: o que na ditadura os partidos atuais não reivindicam, nem a punição aos torturadores, nada que diz respeito à ditadura, por isso o bolsonarismo está aí. Seria necessário redesenhar e pegar o traço do Henfil para enfrentar as situações do presente para dar essa atemporalidade.

10. Como Henfil estaria reagindo à sanha totalitária e anti-democrática que abocanhou os três poderes?

Como ele estaria reagindo à sanha fascista? Ele ESTÁ reagindo, enquanto houver uma licença poética, uma atualização, o Henfil pode continuar através dos seus filhos, dos seus seguidores, a ter essa continuidade. Ele vive, esses caras que estão aí agora são uma cópia carbono suja do que era a ditadura, é só fazer as atualizações e as mudanças dos nomes.

11. Henfil foi um dos fundadores do PT, que se propunha a transformar radicalmente a sociedade. Esta décima terceira pergunta é o espaço pra suas considerações, não finais, mas futuristas. É possível ainda transformar o país de forma radical? O humor entra nisso?

Henfil foi um fundador do PT, ajudou muito o Lula, fez as primeiras camisetas, as primeiras artes junto com o Carlito Maia. Tem de transformar esse país de uma forma radical e o humor é fundamental, não tem nada que se faça sem humor, sem ironia, nós não enfrentamos o presente porque esquecemos o passado, esquecemos o Henfil, por isso estamos nessa merda que estamos hoje, esses caras que estão governando o Brasil são os piores descendentes da ditadura, nós partimos para uma social democracia sem enfrentar a ditadura, sem passar o passado a limpo, e eles voltaram. Você nunca vai ouvir falar nada do Torquato Neto, Rogério Sganzerla, Rogério Duprat, Betânia, Gal, esses trabalhos revolucionários que foram feitos à essência da ditadura, pois o Brasil atual não se interessa pela memória da resistência e vai levar muito tempo para eles abandonarem o poder. Por isso o Henfil é tão pouco conhecido. Do jeito que o PT se tornou conservador não sei dizer se o Henfil teria espaço na imprensa do PT. Uma coisa é o Lula e sua geração de revolucionários, outra coisa é o PT que é uma coisa muito conservadora, muito burocrática, isso você vê também na imprensa sindical. São poucos os cartunistas de ponta que tenham uma produção incrível. Essa arte, essa cultura, não entra nas estruturas partidárias e nem sindicais. Não têm mais a leveza e a mobilidade que o PT tinha em 1979, quando era um partido revolucionário. A arte está sempre à frente da revolução. Tem gente que fala que a arte não faz uma revolução. Isso é o maior equívoco. A arte é o canto, o prenúncio da revolução, você jamais saberia como foram os campos de concentração, a exploração no campo, se não fossem os artistas, Picasso, Portinari, você não saberia nada da humanidade, dos massacres, da escravidão, se não fossem as obras que expressassem esses momentos da história. Nunca ninguém fez uma fotografia de Zumbi dos Palmares, você não sabe como ele era, o jeito dele, isso vale para todos os momentos, você não saberia como Cristo teria sido crucificado se não fossem as obras de arte que traduziram esses grandes momentos da história, você jamais saberia o que foi um quilombo, o massacre dos indígenas ou o que foi Serra Pelada sem as fotos de Sebastião Salgado. Por isso Henfil foi um dos maiores revolucionários da ditadura brasileira. Viva Henfil, viva os cartunistas, viva o Pasquim, viva a toda a imprensa de esquerda alternativa que hoje equivale aos blogueiros. E viva Bira Dantas que me ensinou tudo de quadrinhos, de revolução e de resistência. Muito obrigado

CONTATO COM ADRIANO DIOGO

Adriano é geólogo formado pela USP e político brasileiro, militante pela democracia e pelos direitos humanos. Começou sua militância na década de sessenta no movimento secundarista. Foi perseguido, preso em 1973 e torturado no DOI-Codi de São Paulo. Teve quatro mandatos de vereador (de 1989 a 2003) ocupando-se das áreas do meio ambiente, da saúde pública, educação, moradia popular e das regiões periféricas. Em 2004 foi secretário de Verde e Meio Ambiente na prefeitura de Marta Suplicy. Foi eleito deputado estadual em três mandatos (2002, 2006 e 2010). Foi membro da Comissão de Direitos Humanos da ALESP, na qual presidiu a Comissão da Verdade do Estado de São Paulo Rubens Paiva (que investigou e divulgou os crimes cometidos pela ditadura militar em nosso estado), o SOS Racismo e a CPI dos Trotes. Fez várias campanhas eleitorais usando Gibis em Quadrinhos como peça principal de propaganda.

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AQC entrevista: Junião sobre Henfil

Esta série de entrevistas é uma iniciativa da AQC em apoio ao livro “Sick da Vida”, coletânea de entrevistas do cartunista Henfil organizadas pelo quadrinhista, jornalista, escritor e biógrafo Gonçalo Silva Jr. O livro foi lançado na plataforma Catarse pela Editora Noir. Por isso, pedimos que você apoie, compartilhe e comente. https://www.catarse.me/henfil

1. Como você conheceu o trabalho do Henfil?

O trabalho do Henfil eu conheci há muito tempo atrás, não existiu um marco. Minha família sempre foi muito esclarecida, desde a época da minha bisavó, minha mãe frequentava Universidade, trabalhava na Unicamp… então leitura de jornal, livro e essas conversas sobre ditadura militar, repressão, sempre foram muito frequentes dentro de casa. Eu sempre gostei muito de cartum e charge, né? E como disse no comço, sempre teve jornal em casa. E uma vez, não sei se por um comentário de alguém, mas chegou um trabalho do Henfil na minha mão. Não lembro se era O Pasquim, só lembro que vi e gostei muito do traço dele. Eu já gostava muito de outros cartunistas coo Angeli, Glauco, Laerte. Naquela época a gente ia muito em banca de jornal, não tinha dinheiro pra comprar revistas, mas ficava folheando as coisas. Então conheci o trabalho do Henfil meio nesta toada assim: olhando revistas em banca de jornal, o traço dele já me chamou muito a atenção na época. E lá com meus 14 ou 15 anos comecei a defender uma graninha e gastava nos sebos de livros e discos e aí, encontrei o Fradim e o cara que vivia com medo, O Ubaldo o Paranóico. Com 16, 17 anos comprei três livrinhos do Henfil. Achava o humor dle bem ácido, fazia rir, mas fazia uma crítica social muito pertinente. Foi nesta minha fase entre adolescente e adulto que folheando revistas nas bancas e conversando em casa.

2. Qual foi o impacto inicial?

Foi este que descrevi acima. O traço dele me chamou muita atenção. Dos traços que eu via na época era o que tinha mais personalidade, masi expressão. Sempre gostei muito de ver um traço que já fosse a assinatura do artista. E também o tipo de humor, ele criava personagens pra falar da história do Brasil e através deles contava histórias. O que mai me impactou foi a qestão do traço forte, da crítica social pertinente e o modo que ele usava personagens pra criar como se fosse uma novela. Eu sempre gostei muito de artistas, cartunistas que contam histórias. Iso me marcou muito.

3. O que chamou mais atenção o humor escrito, as gags visuais ou o traço?

Complementando o que falei antes, eu não separo essas coisas, traço, humor, texto. Todas têm suas funções, não são independentes, caminham juntas e dão o ritmo da história que você está contando. Eu costumo brincar que tenho uma herança da época do Henfil, que é esse modo de contar a história, com ritmo. Todos elementos citados: humor escrito, gag visual e traço dão ritmo na história. Henfil não é só traço, só gag, é ritmo. Eu acho sensacional esse ritmo dele tranmitir o que quer.

4. Seu trabalho teve influência direta? Se teve, em que sentido?

Obviamente meu trabalho teve influência. A gente vai crescendo e vai vendo o trabalho de outros artistas, de cada um a gente vai trazendo alguma coisa pro seu trabalho. E essas influências mudam. No meu início de carreira tive muita influência do Henfil por conta do que eu disse antes, do ritmo de contar histórias, do ritmo em que você trabalha o tema, de contar tudo de uma maneira que impacte o leitor. Isso é uma coisa que trago muito comigo de Henfil, Angeli, Glauco, Laerte, até de outros como Emouri Douglas, artista gráfico dos Panteras Negras, que tem um cartum e ilustração mais posicionados. O Henfil com certeza é uma das minhas influências nesta questão de como trabalhar o ritmo do cartum, das histórias e a intensidade do traço.

5. Qual foi a impacto dos Quadrinhos e Charges do Henfil na Imprensa Sindical?

Até então a imprensa sindical também foi uma referência quando eu ‘tava começando a produzir as minhas charges, buscando até informação política, porque eram textos, imagens e cartuns que você não via na imprensa tradicional. Na imprensa sindical a gente tinha oportunidade de enxergar e entender outras perspectivas que não era uma perspectiva branca, pró mercado, pró ‘status quo’ que a imprensa tradicional sempre teve, né? A imprensa sindical trazia esta outra perpectiva mais proletária, que falava mais ds divisões de classe. Na minha adolescência, minha formação política foi dentro de casa, mas foi na rua também. E esse era assunto recorrente, não só a imprensa sindical, mas jornais e revistas negras, que traziam tudo da imprensa sindical somada à questão racial. Acho que é uma falha que a esquerda de hoje ainda tem, que é muito branca. Não tem como discutir classe no Brasil se não discutir raça. São coisas que estruturam o capitalismo. Não tem como discutir um sem o outro e a nossa esquerda branca evitava essa discussão com argumento furado de que isso dividia o movimento. Minha formação então teve muita influência da imprensa sindical como referência, com os trabalhos de Henfil, Laerte, Bira, mas questão racial eu tinha de ver por outros modos.

6. Acompanhava as entrevistas do Henfil na Imprensa?

Eu lembro muito pouco disso. Lembro do rosto dele, dele falando, mas não lembro de nenhuma entrevista que tenha marcado forte pra mim. Acho que mais por falta de acesso na época, porque ainda não tinha intenet e a gente não tinha dinheiro pra comprar revista. Não lembro de O Cruzeiro, mas folheava muita revista nas bancas e o que mais vi mesmo foram coletâneas com Quadrinhos do Henfil, do Fradim e de outros personagens. Eu não o acompanhava na recorrência semanal ou mensal das publicações, mas procurava seus livros e revistas em sebos, onde eu tinha mais acesso.

7. O que achou da iniciativa da Editora Noir em reunir estas entrevistas em um livro? Que efeito acha que este livro terá em você e nos demais leitores?

Acho sensacional essa ideia da editora porque, como eu era muito novo na época, é uma chance de ter acesso a isso tudo. Tudo bem que hoje em dia a gente tem internet, tem vários canais, mas livro é livro, né, velho? E poder ler, poder entender melhor o contexto daquela época é muito importante. E o Henfil é um personagem, dentre vários personagens da história do Brasil, muito pouco trabalhado. Eu, pelo menos, vejo pouca gente falando sobre quem ele era. E é um cara que merece ter seu trabalho e sua vida mais discutidos.

8. Henfil era um profissional multimídia, atuando na TV e no Cinema. O que achou das produções do cartunista em TV Home e Tanga, deu no New York Times?

Eu sou meio suspeito pra falar. Eu atuo como cartunista, sou diretor de um jornal, tenho trabalho com música, um pé nas Artes Plásticas, então é natural que o cartunista procure novas formas e novas plataformas pra contar suas histórias, né? Eu acho também que o cartunista é um contador de histórias, mas a plataforma que é usada pra isso pode ser variada. Então, pô, tem que trabalhar com TV, tem que trabalhar com cinema, porque cada plataforma tem sua técnica, suas ferramentas, seu modo de funcionar e de atingir as pessoas. Talvez a televisão atinja uma população que o cinema não atinge, que o jornal não atinge, que o livro não atinge. E isso só tem a acrescentar, né? Quanto mais linguagens, quanto mais formatos, mais plataformas a gente consegue ter acesso, trabalhar e contar nossas histórias, mais polido vai ficando o nosso modo de dizer o que queremos dizer e assim, ter feedbacks diferentes de públicos diferentes, né? Acho isso sensacional. É uma das coisas que o Henfil fazia, a Laerte fazia, Miguel Paiva fazia, tem que misturar as coisas. Quanto mais a gente diversifica o nosso modo de atuar, diversifica o nosso modo de olhar, passamos ater uma noção melhor de qual é essa realidade que habitamos… de quantas populações atingimos e dialogamos. Acho sensacional isso.

9. As novas gerações conhecem pouco do trabalho do Henfil. Apesar de uma exposição de originais no Centro Cultural Banco do Brasil (2005) no Rio e em SP ter tido público recorde na época, o trabalho dele ainda é pouco compartilhado nas redes. O que fazer pra melhorar isso? O livro organizado pelo Gonçalo Jr pode ajudar?

Esse é um problema não só em relação ao artista Henfil, é um problema que a gente tem aqui no Brasil. A gente tem essa desiguldade social que beneficia muito o que essa elite branca quer falar e quer mostrar. Pra tudo isso existe dinheiro, poder, espaço. Enquanto a gente tiver essas seis famílias que dominam a imprensa brasileira, uma elite branca, vinda da burguesia cafeeira que ainda está aí! Quem consegue virar cultura de massa hoje? Só quem essa elite quer. Assim como o Henfil, é muito difíci a gente ver artistas negras e negros que se destacaram dese a época do Brasil-colônia. Por que não temos essas pessoas nos livros de história? Porque é esse mesmo pensamento racista, misógino, homofóbico que impera desde a colonização do Brasil. É difícil você ter personalidades com destaque, que fujam dessa construção de imaginário dessa elite branca.O Henfil entra nesse rol porque era um artista que provocava essa elite e trazia uma reflexão em relação a essa elite. Não tem espaço pra pessoas que questionem o status quo. Assim, não tem espaço pra Henfil, pra Carolina de Jesus, Arthur Timóteo, pintor do começo do século, fazia parte das Belas-Artes, sabe-se muito pouco de Luiz Gama, de André Rebouças, porque foram pessoas que enfrentaram o sistema. É difícil colocá-los no imaginário popular hoje.

10. O Brasil hoje está ‘sick da vida’ com tantos ataques à democracia, à inclusão social, racial e de gênero, à distribuição de renda. Como seria ter Henfil conosco nos dias de hoje?

A gente precisa ir um pouco mais além, nossos vários núcleos de esquerda tem de entender o que queremos dizer com democracia, porque parece que democracia só foi ausente na época da ditadura militar e agora depois que o Bolsonaro tomou o poder.Mas se for perguntar pra galera da periferia, pra população preta, pobre e periférica, eles vão falar pra você qu e a democracia nunca existiu aqui no Brasil, sacou? Porque a violência policial, violência de estado, violência racial, vioência de gênero sempre estiveram aí, brother! Na ditadura, no governo bolsonaro, foi mais intensa, mas no Brasil sempre foi isso. Eu não gosto desta tese de que a democracia tá ameaçada agora. Ela sempre teve. A gente nunca teve democracia. O Brasil foi criado na base do derramamento de sangue, da violência do estupro. O Bolsonaro e a ditadura militar são refexos disso aí! O Brasil foi criado pra manter países ricos recebendo de bandeja o que a gente tem de melhor aqui. A gente vive num Capitalismo dependente, periférico. Ou seja, democracia aqui sempre passou longe. Mas claro, temos instrumentos pra lutar contra isso, trazer democracia de verdade, temos uma Constituição interessante, mas não gosto de falar que a democracia tá ameaçda não… Não é de agora. Taí a desigualdade social pra falar, as violências escancaradas. A parte boa é que os movimentos sociais estão com muito mais força, até pra esfregar isso na cara das esquerdas que nunca quiseram entender, sempre acharam que era um problema da classe, mas não. Vai ter que discutir raça, gênero e várias outras questões pra discutir democracia de verdade, que aqui nunca existiu.

11. Como Henfil estaria reagindo à sanha fascista, totalitária e anti-democrática que abocanhou os três poderes?

Henfil estaria com a mão pesada dele, criticando o conservadorimso, o fascismo, essa elite fascistas, mas também os dirigentes das esquerdas, não as bases, que depois do governo Lula deram uma sossegada no rolê e pararam de se comunicar com as bases. Não é voltar pras bases, é dialogar com as bases. São coisas muito diferentes. Esse diálogo tinha cessado, mas tá voltando porque os movimentos sociais estão pressionando os dirigentes.

12. Henfil foi um dos fundadores do PT, que se propunha a transformar radicalmente a sociedade. Esta décima terceira pergunta é o espaço pra suas considerações, não finais, mas futuristas. É possível ainda transformar o país de forma radical?

Eu acho que é possível transformar o país de forma radical mas desde que, como dizia Garrincha ‘se combine com os russos’, né? O PT sempre foi sozinho. A elite petista sempre foi fechada nela mesma, e vai ter que negociar com o movimentos sociais isso aí! Tem varias vozes aí que sempre quiseram espaço e o próprio PT nunca deu. Só que agora esses movimentos estão batendo na porta de maneira diferente. Moviemto de negro, movimento indígena, movimento de moradia, eles descobriram: “Ou é com a gente ou não vai ter!” Acho que é possível sim, um movimento mais radical, mais ligado às questões sociais de fato, porque… com vida, você não negocia VIDA, né brother? Então quando a gente coloca na cabeça que não vai negociar vida, só isso daí já é radical, velho. Radical em termo de raiz, né? Em termos de igualdade e quidade de direitos. Os movimentos não estão pra brincadeira não! Se o PT quiser fazer algo nesse sentido, ele vai ter que estar COM os movimentos sociais e dialogar, abrir espaço, aí eu acho que vai ser possível sim. Até porque se o PT não fizer isso, vai cair de novo e vai cair feio, porque os movimentos sociais vão cobrar isso. É isso, espero que tenha respondido. Por whatsapp tudo fica mais frio, é sempre melhor ter uma conversa dessa tomando uma cerveja e trocando, frente a frente, até pra gente aprender junt. De consideração final fica aí meu desejo eterno de mudança, mas com muito otimismo. Pra mim, o bolsonaro já caiu, o problema é o bolsonarismo. Hoje em dia eu brigo mais com o bolsonarismo, essa galera que saiu das catacumbas, que me precupa. Muito jovem aí não viveu o governo Lula. Nosso trabalho é grande e árduo pra mirar nesta questão racista, classista que vem desde o começo do país, o bolsonaro colocou isso pra fora, colocoou essa bola. Já que colocou a bola, vamos chutar ela, pai! Pra gente começar a pensar em democracia de fato, e não ficar no banho-,aria de reforminha aqui, reforminha ali. Temos que colocar o Estado pra trabalhar pra nós!

CONTATO COM JUNIÃO

Nascido em Campinas (SP), é formado em Artes Visuais pela Unesp/Bauru e faz jornalismo ilustrado desde 1994. Atuou como designer e cartunista em veículos como Folha de S.Paulo, O Estado de S.Paulo, Veja e Courrier International (França). Ganhou o Salão Internacional de Desenho para Imprensa de Porto Alegre, em 2011, o prêmio Vladimir Herzog de 2005 e menção honrosa em 2006 (categoria artes), além do prêmio de cartuns sobre Aids do Ministério da Saúde, em 2004. Em 2018, seu livro infantil ‘Meu Pai Vai Me Buscar na Escola’ foi para escolas e bibliotecas públicas do país pelo programa PNBE2018. Tem textos publicados em livros coletivos no Brasil e Alemanha. Mora em São Paulo, e atualmente é Diretor de Arte e Coordenador de Projetos na Ponte Jornalismo.

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AQC entrevista: Carol Cospe Fogo sobre Henfil

Esta série de entrevistas é uma iniciativa da AQC em apoio ao livro “Sick da Vida”, coletânea de entrevistas do cartunista Henfil organizadas pelo quadrinhista, jornalista, escritor e biógrafo Gonçalo Silva Jr. O livro foi lançado na plataforma Catarse pela Editora Noir. Por isso, pedimos que você apoie, compartilhe e comente. https://www.catarse.me/henfil

1. Como você conheceu o trabalho do Henfil?

Minha primeira lembrança do trabalho do Henfil vem de uma fachada de escola em Belo Horizonte que tinha seu nome. Eu ainda criança olhei aquele desenho e imediatamente me apaixonei. Era forte e intrigante pra mim.

2. Qual foi o impacto inicial?

Era incrível ver o quão solto o traço parecia. Quase despretensioso. Forte!

3. O que chamou mais atenção o humor escrito, as gags visuais ou o traço?

O traço e o “papo reto”, como dizem. Certeiro e objetivo.

4. Seu trabalho teve influência direta? Se teve, em que sentido?

Teve e tem influência. Quando vejo colegas falando de sua personalidade, me sinto ainda mais atraída por seu trabalho!

5. Qual foi a impacto dos Quadrinhos e Charges do Henfil na Imprensa Sindical?

O trabalho do Henfil é militante. É defensor do trabalhador.

6. Acompanhava as entrevistas do Henfil na Imprensa?

Penso que a fala e o traço do Henfil funcionavam como diretrizes. A mensagem sempre clara.

7. O que achou da iniciativa da Editora Noir em reunir estas entrevistas em um livro? Que efeito acha que este livro terá em você e nos demais leitores?

Será incrível. Teremos novamente a chance de saber a perspectiva do Henfil nesses temas que andam nos assombrando atualmente.

8. Henfil era um profissional multimídia, atuando na TV e no Cinema. O que achou das produções do cartunista em TV Home e Tanga, deu no New York Times?

Não conheci ainda essas duas produções, infelizmente. Mas com a gana e desenvoltura em se adaptar e circular em outros universos que Henfil demonstrava, teria vasto caminho em tempos atuais, repletos de diversidade de mídia.

9. Pra você, qual é o tamanho da falta que Henfil faz?

Lamento não termos agora uma pessoa tão criativa, ousada e ácida combatendo tantas mazelas políticas e sociais.

10. As novas gerações conhecem pouco do trabalho do Henfil. Apesar de uma exposição de originais no Centro Cultural Banco do Brasil (2005) no Rio e em SP ter tido público recorde na época, o trabalho dele ainda é pouco compartilhado nas redes. O que fazer pra melhorar isso? O livro organizado pelo Gonçalo Jr pode ajudar?

O legado de Henfil é sentido mesmo por aqueles que não conheceram muito seu trabalho. A porta que Henfil ajudou a desenhar é caminho aberto para vários hoje. Inclusive eu. Esse livro é uma grande iniciativa, e certamente nos devolverá o pensamento crítico de Henfil.

11. O Brasil hoje está ‘sick da vida’ com tantos ataques à democracia, à inclusão social, racial e de gênero, à distribuição de renda. Como seria ter Henfil conosco nos dias de hoje?

Acredito que Henfil estaria liderando movimentos de resistência. Seria um grande agente diluidor dessa cortina constante de fumaça que atrapalha e divide nossa sociedade.

12. Como Henfil estaria reagindo à sanha fascista, totalitária e anti-democrática que abocanhou os três poderes?

Com acidez. Provavelmente teriam tentado enquadrá-lo na Lei de Segurança Nacional.

13. Henfil foi um dos fundadores do PT, que se propunha a transformar radicalmente a sociedade. Esta décima terceira pergunta é o espaço pra suas considerações, não finais, mas futuristas. É possível ainda transformar o país de forma radical?

O PT que Henfil ajudou a criar acabou se moldando à política dos demais partidos. Sinto que se ainda estivesse por aqui, Henfil tentaria manter o perfil do partido mais ligado aos seus ideais. O radicalismo não é bom em nenhum aspecto. Para mim, o cidadão precisa entender que não basta a tal empatia. Pois normalizou-se que ser empático é simplesmente se colocar em posição superior e ver o outro com compaixão passiva, sem atitude. O que precisamos é RECONHECIMENTO. Precisamos nos reconhecer como iguais.

CONTATO COM CAROL ANDRADE

Carol Andrade é mineira de Belo Horizonte e tem 38 anos. É diretora de arte e ilustradora. Usa o nome ‘Carol Cospe Fogo’, apelido que ganhou pela maneira ácida que retrata o cotidiano. O desenvolvimento do seu trabalho e construção do pensamento vem de um perfil de muita observação e curiosidade. Há 6 anos vive no Rio de Janeiro e se dedica às charges com temas socais e políticas. É a primeira mulher a receber o prêmio Angelo Agostini como melhor cartunista/caricaturista do Brasil em 2019.

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Twitter: @carolcospefogo